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O vazio dos likes e a banalização da influência

O vazio dos likes e a banalização da influência

Os “likes” ou curtidas nas postagens em redes sociais já foram objeto de reflexão e análise especializada no campo dos estudos de comunicação social, das ciências sociais e psicologia. Também é famoso o primeiro episódio da terceira temporada da série Black Mirror, que recebeu o nome “Queda Livre” e abordou de forma bastante contundente essa distopia tecnológica trazida pelas redes sociais na contemporaneidade. O episódio narra o desenvolvimento patológico da obsessão por likes em redes sociais em um contexto futurista, com clara referência no presente.

A discussão voltou à tona nos últimos dias em função da decisão da rede social Instagram, anunciada na quarta-feira passada, de incluir o Brasil em uma experiência já em prática no Canadá, que consiste em ocultar para o público a quantidade de curtidas nas respectivas postagens.

A justificativa aponta para um conjunto de medidas que teria como objetivo proteger a saúde mental dos usuários.

É inegável que a questão da autoestima e da projeção da imagem de sucesso e imperativo de felicidade; da afirmação do status social e o exibicionismo egocêntrico;  da ostentação do consumo e do “life style”; tudo isso tem adquirido um caráter tóxico e identificado como diretamente relacionado com a epidemia de depressão que se instalou nos países avançados do capitalismo. O mundo das aparências das redes sociais e o Rivotril são marcas dessa classe média urbana neoconservadora, ávida por visibilidade e afeto diante do vazio existencial irremediável trazido pelo consumismo e pela completa falta de perspectiva utópica e coletiva.

A rede Instagram, entre outras redes sociais, foi aquela que adquiriu ao longo dos anos um caráter mais marcadamente comercial, e a métrica das curtidas e “seguidores” passou a ser um parâmetro utilizado pelas empresas para contratar publicidade em determinados perfis de denominados influenciadores digitais ou “produtores de conteúdo”. Resulta daí que a toxicidade foi transformada em negócio, o vício em pretensa profissão ou fonte de renda, alimentada por cases de pessoas que foram transformadas instantaneamente em “personalidades midiáticas” de grande visibilidade, em função de alguma “lacração” viralizada na internet.

O problema é que, na maioria dos casos, essa visibilidade tem se revelado efêmera, que tais “personalidades” são desinteressantes a médio e longo prazos.

Tem ficado claro uma baixa ou quase nula capacidade de influência desses “influenciadores”. É cada vez mais notório que em concreto, esses autointitulados “produtores de conteúdo” não produzem nenhum tipo de conteúdo realmente relevante, que os tais seguidores são como almas penadas que não usam cartão de crédito.  Os influenciadores têm se revelado, em maioria, embustes: não são experts de coisa alguma, não dominam nenhuma linguagem artística, não representam concretamente nenhuma instituição que mereça reconhecimento por sua relevância e impacto real na vida da sociedade.

O vazio dos likes e a banalidade da influência são evidenciados quando as expectativas de retorno comercial por parte das empresas ao contratar esses perfis inflados de ego, são frustradas pelos números reais. Os likes se revelam, portanto, um parâmetro inadequado para se identificar uma influência real sobre determinado público consumidor.  Outros indicadores de interações efetivas nas postagens, tais como comentários e compartilhamentos estão recebendo mais peso.

É bem possível que os aspirantes a influenciadores, cientes das métricas, passem a estimular de forma deliberada e insistente essa interação, o que pode ter o efeito contrário do esperado, irritando e afugentando o público em função da busca de forçar um comportamento que só tem concretude se for realmente espontâneo. O Instagram parece aderir a uma tendência já sinalizada anteriormente pelo Youtube de utilizar parâmetros mais realistas para conduzir os algoritmos e explorar o potencial mercadológico dessas plataformas e redes sociais.

Isso talvez resulte em um novo patamar de competição entre os pretendentes a “influenciadores”, forçando uma profissionalização e destaque real, de mérito, em alguma área específica de atividade profissional, ou seja, uma qualificação maior voltada para públicos específicos.

Talvez então passaremos a poder falar de uma influência concreta pelo reconhecimento social de alguma expertise, pela produção de conteúdo socialmente relevante…

…e assim a internet decante esse alvoroço de gente frustrada buscando visibilidade a qualquer custo, sem se questionar o motivo pelo qual elas deveriam ser vistas, sem questionar se o “conteúdo” que elas julgam “produzir” contém mesmo algo produzido originalmente por elas.

Particularmente, eu me mantenho bastante cético, sobretudo com relação ao Brasil, tendo em vista o volume gritantemente visível do analfabetismo funcional, fruto do completo colapso do sistema educacional. Isso faz com que a população de forma geral se encontre desarmada de instrumentos de crítica para identificar os impostores, os falsos “entendedores” que julgam manifestar “análises” e “opiniões” nas redes sociais disseminando senso comum sob efeito manada, quando muito não se trate de desinformação e fake news pura e simples.

Também o analfabetismo funcional convertido em analfabetismo político tem possibilitado a conversão do capital midiático desses “influenciadores” em capital político, o que nos conduziu a esse quadro particularmente sombrio de acelerado retrocesso civilizatório que nos encontramos hoje. De toda forma, no Brasil, em maioria, os tais “influenciadores” podem ser identificados mais como “imbecilizadores profissionais”, na sugestão da filósofa Márcia Tiburi,  como indicamos em outro texto publicado nesse mesmo blog,  qual recomendo a leitura: A Imbecilização Profissional nas Redes Sociais.

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Fábio Pires Gavião

É Autor/Colaborador do UniversoNERD.Net. Professor de História e gamer na plataforma Xbox One nas horas vagas. GT: Gavian Gamer.

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