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O que é Liberalismo? (Parte 2)

O que é Liberalismo? (Parte 2)

Os fundamentos do liberalismo político

Dá-se o nome de regimes representativos às formas com as quais se reorganizaram historicamente as estruturas do Estado em substituição ao Antigo Regime ou ao Absolutismo Monárquico.

Como atentamos na Parte I desse texto, o liberalismo é uma doutrina política e econômica forjada em um movimento filosófico mais amplo, o Iluminismo (séculos XVII e XVIII), o qual se opôs diametralmente aos fundamentos da visão de mundo da aristocracia europeia, cujo poder simbólico era solidamente ancorado na mentalidade medieval permeada pela religiosidade cristã-católica.

O liberalismo político fundamentou as chamadas “Revoluções burguesas” no século XVIII e seus princípios estruturaram os regimes representativos contemporâneos.

Portanto, o liberalismo pode ser compreendido como constituinte da visão de mundo de uma nova de classe social hegemônica, a burguesia, antes associada, mas submetida ao poder político e simbólico da nobreza aristocrática.

O desenvolvimento do capitalismo mercantil a partir do século XIV, acelerado pelo estabelecimento de um comércio ultramarino de proporções mundiais, já robusto no século XVI, paulatinamente,  aguçaram as contradições de interesses entre a nobreza e a burguesia, quadro este que desembocou nos longos processos revolucionários a partir do séculos XVII, que por sua vez, impuseram o desmantelamento do Absolutismo Monárquico na Europa e em suas colônias e a substituição deste por regimes representativos.

Sendo assim, como a instalação desses novos regimes tiveram sua condução liderada pela burguesia e sua correspondente doutrina política, o liberalismo, podemos também denominar os regimes representativos como formas do Estado liberal-burguês, expressando, portanto, a hegemonia política da burguesia e sua correspondente doutrina política.

Noções fundamentais do liberalismo político

1 – A soberania popular

Um primeiro aspecto a ressaltar nos processos revolucionários que instauraram os regimes representativos no Ocidente, foi a transferência da soberania ou da origem do poder/autoridade do monarca para o povo. A noção medieval da origem divina do poder do monarca absoluto é substituída pelo princípio de que a legitimidade do governo e da lei está no fato de que ambos expressam a vontade e o consentimento popular.

Na Constituição Federal Brasileira de 1988, esse princípio está expresso no bonito parágrafo único do Art. 1º:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

Parágrafo único. Todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição.

O princípio da soberania popular já estava presente no início da Revolução Francesa, em 1789, na famosa Declaração dos Direitos dos Homens e do Cidadão, mais precisamente em seu Art. 3º:

Art. 3º “O princípio de toda a soberania reside essencialmente na Nação. Nenhuma corporação, nenhum indivíduo, pode exercer autoridade que aquela não emane expressamente”.

Observe-se que o termo “Nação” tem a conotação de “povo” nesse documento.

Mais precisamente, a noção de que a legitimidade da lei se encontra na soberania popular é expressa no Art. 6º da mesma Declaração:

Art. 6º. A lei é a expressão da vontade geral. Todos os cidadãos têm o direito de concorrer, pessoalmente ou através de mandatários, para a sua formação. Ela deve ser a mesma para todos, seja para proteger, seja para punir. Todos os cidadãos são iguais a seus olhos e igualmente admissíveis a todas as dignidades, lugares e empregos públicos, segundo a sua capacidade e sem outra distinção que não seja a das suas virtudes e dos seus talentos.

2 – O Estado de direito e a isonomia

Tendo em vista toda sorte de abusos do poder experimentados por séculos de regimes autocráticos, o liberalismo político tem a preocupação de assegurar que há poderes e limites para esses poderes.

Os limites do poder do Estado e dos agentes que atuam em seu nome, bem como as regras para a ocupação dos cargos na burocracia do Estado e as regras do jogo político no que tange a periodicidade dos mandatários no poder; deverão estar claramente definas no ordenamento jurídico máximo, a Constituição.

O Estado de direito, portanto, é o Império da lei, isto é, um Estado onde ninguém está acima da lei, nem mesmo o governante máximo desse Estado, seja ele um monarca, um presidente, um conselho coletivo, um primeiro-ministro, não importa o nome que se dê a essa posição.

Depreende-se, dessa forma, que todos são iguais perante a lei, ou seja, o Estado de direito submete e está submetido a todos da mesma forma, é um Estado de isonomia, dos radicais gregos iso-igual e nomia-norma. Retome-se o princípio da isonomia expresso no Art. 6º na Declaração dos Direitos dos Homens e do Cidadão de 1789, a lei “deve ser a mesma para todos, seja para proteger, seja para punir”.

O Estado de direito também assegura os limites da liberdade individual, que em uma definição simples, compreende tudo aquilo que não é proibido pelas leis.

Estabelece-se, portanto, uma definição clara de deveres e de direitos, na relação entre os indivíduos e o Estado e na relação entre os próprios indivíduos. O Estado de direito estabelece um regramento da esfera pública (Direito Constitucional, Direito Público) e da esfera privada (Direito Civil), determinando, claramente, os limites da interferência de uma esfera sobre a outra.

Compreenda-se que antes, no Antigo Regime, tínhamos a figura do monarca e dos súditos a ele submetidos. Os súditos tinham uma relação passiva com o Estado, sendo objeto apenas de deveres e embora houvesse direitos e liberdades praticadas pela tradição, diante do poder irrefreável do monarca não havia, de fato, garantias legais nem da liberdade, nem de direitos, tais como a privacidade ou a propriedade.

3 – A cidadania

O Estado de direito transforma o súdito em cidadão, com direitos considerados naturais, intrínsecos e indissolúveis enquanto ser humano, e ainda confere aos cidadãos os direitos e deveres enquanto participe da nação ou povo abrangido por aquele Estado. Em outras palavras, a função do Estado de direito é garantir a prática da cidadania e os respectivos diretos e deveres de cada cidadão.

Eis a origem da noção de Direitos Humanos: trata-se de algo tão fundamental para o avanço do processo civilizatório da humanidade, que posicionamentos contrários aos Direitos Humanos são incompreensíveis, constituem uma abominação política e cognitiva.

Observe-se na Declaração dos Direitos dos Homens e do Cidadão, de 1789, exemplos das liberdades e direitos considerados fundamentais:

– O princípio da liberdade como direito natural – que protege todo ser humano da escravidão, servidão e submissão de castas.

Art. 1º– Os homens nascem e são livres e iguais em direitos. As distinções sociais só podem fundar-se na utilidade comum.

O princípio de propriedade privada como direito natural – que impede que o Estado ou outras pessoas tomem posse daquilo que é propriedade de alguém.

Art. 2º– O fim de toda a associação política é a conservação dos direitos naturais e imprescritíveis do homem. Esses Direitos são a liberdade, a propriedade, a segurança e a resistência à opressão.

– O princípio fundamental do Habeas corpus – que impede que o Estado prive sua liberdade de forma arbitrária.

Artigo. 7º. Ninguém pode ser acusado, preso ou detido senão nos casos determinados pela lei e de acordo com as formas por esta prescritas. Os que solicitam, expedem, executam ou mandam executar ordens arbitrárias devem ser punidos; mas qualquer cidadão convocado ou detido em virtude da lei deve obedecer imediatamente, caso contrário torna-se culpado de resistência.

– O princípio fundamental da presunção da inocência – que impede que você seja considerado culpado até que se prove o contrário.

Art. 9º. Todo acusado é considerado inocente até ser declarado culpado e, se julgar indispensável prendê-lo, todo o rigor desnecessário à guarda da sua pessoa deverá ser severamente reprimido pela lei.

O princípio fundamental da liberdade de expressão – que impede que você seja reprimido na manifestação da sua consciência e posições políticas.

Art. 10º. Ninguém pode ser molestado por suas opiniões, incluindo opiniões religiosas, desde que sua manifestação não perturbe a ordem pública estabelecida pela lei.

Art. 11º. A livre comunicação das ideias e das opiniões é um dos mais preciosos direitos do homem. Todo cidadão pode, portanto, falar, escrever, imprimir livremente, respondendo, todavia, pelos abusos desta liberdade nos termos previstos na lei.

– Princípio fundamental da transparência e publicidade de informações sobre a administração pública – que obriga o Estado a prestar contas aos cidadãos.

Art. 14º. Todos os cidadãos têm direito de verificar, por si ou pelos seus representantes, da necessidade da contribuição pública, de consenti-la livremente, de observar o seu emprego e de lhe fixar a repartição, a coleta, a cobrança e a duração.

Art. 15º. A sociedade tem o direito de pedir contas a todo agente público pela sua administração.

Perceba-se que todos esses princípios são conquistas civilizatórias de descomunal importância, a observância e respeito a eles deve ser permanente, e toda sociedade que deles se afastam correm o risco de sucumbir à tirania. É evidente que os princípios do liberalismo político podem e devem ser questionados quanto aos seus limites, suas imperfeições, mas nunca desprezados.

Há situações onde ocorrem choques oriundos das contradições sociais levadas a afeito pelas desigualdades, principalmente econômicas, que em muitos casos fragiliza e até inviabiliza a observância e harmonia entre esses direitos naturais que o Estado deve proteger: “a liberdade, a propriedade, a segurança e a resistência a opressão”.

No próximo texto da série, aprofundaremos a questão sucessória do Estado liberal-burguês, ou seja, a construção histórica do sistema representativo, da participação dos cidadãos na condução da vida pública, as democracias contemporâneas.

Para finalizar, gostaria de deixar algumas questões para reflexão e debate:

1. Como você julga a observância dos princípios do liberalismo político no Brasil atual?

2. No Brasil, podemos afirmar que todos são iguais perante a lei?

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Fábio Pires Gavião

É Autor/Colaborador do UniversoNERD.Net. Professor de História e gamer na plataforma Xbox One nas horas vagas. GT: Gavian Gamer.

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